Claricianas XI
Deito-me no noturno dos caminhos percorridos.
Estico minha preguiça às estrelas. Os
silêncios, de que sou feita, me liquefazem. Sei como inventar um pensamento, mas
recuso essa força visceral. Não quero minha parte humana a dominar o corpo.
Sepultei meus sonhos na imagem de um homem. Mas os sonhos
não foram capazes de torná-lo real. Agora sou amiga do tempo. Conversamos por telepatia. De vez em quando ele me dá uma prova de vida, como o instante
que se quebra, agora, diante do meu olhar e desamarra as possibilidades de algo
premeditado. Mas minha felicidade é ainda um caracol que o tempo custa a
desenrolar. Carrego nas costas essa espiral realista. Às vezes não falo, para
não entristecer mais a vida. Em outras, como agora, não falo para não ser
obrigada a pensar. Pensar é pontuar a vida. É colocar um ponto infeliz ao final
de qualquer frase. Há muitos pontos desnecessários. Eu tenho vários deles
trancando minha história. Caixa denpandora com tantas emoções resguardadas.
Tudo velado pelo medo de parecer frágil, parecer fácil, parecer humana demais.
Quem nasce mulher tem a obrigação de ser forte, alertava-me minha avó desde
cedo. Ser forte é apalpar o vazio da ausência sem chorar. Por isso essas mãos
escalavradas. Esses traçados tortos na linha do meu destino. Minha filha nunca
será forte, mesmo que um dia resolva nascer mulher.