Ser Professor
Professor, palavra bela arranhada por uma imperfeição: a
impossibilidade de não tornar o outro, sábio. Sabedoria não se transmite, já
dizia Proust. É preciso que cada um a descubra depois de uma longa caminhada.
Sabedoria é uma maneira de ver as coisas. Essa é a grande frustração com a qual
se depara o mestre. É um subterfúgio que povoa o que deveria ser um substantivo
concreto. Ou seria um verbo? Refletindo melhor, a palavra professor deveria ser
verbo. Verbo professorar conjugado num eterno gerúndio. E ainda ousaria
contribuir para um significado mais justo. Professorar - verbo transitivo
direto que quer dizer ensinar e aprender; antítese. Porque o professor tem de
conviver com esses dois mundos paradoxais e engendrá-los perfeitamente de forma
a não se sentir "concluído" em nenhum deles.
Ser professor é ter algo sempre por melhorar. Por maior
que seja seu contorno dentro do quadro negro, por mais narcísica que seja sua
postura diante de novos métodos e paradigmas, ele sabe, bem lá no íntimo, que
precisa tentar, arriscar, inovar porque dele depende a evolução do outro. Ser
professor é ser parte da vitória ou da derrota do seu discípulo. Um ofício que
envolve compromisso, coração e razão. Liberdade e responsabilidade. Uma equação
que geometriza um sentimento. Uma poesia que carboniza o giz. O vento apaga as
letras, mas os catadores de esperança levam-nas no peito. O resultado só virá
amanhã, quando ambos se encontrarem nos consultórios, nos parlamentos, nas
repartições públicas e depararem-se com uma frase antiga no ar: "É o meu
professor". E o professor se assusta com o pronome oblíquo ou com o objeto
indireto meio fora de lugar. Mas reconhece alguns gestos e palavras que foram
suas. De repente, o anjo sonolento da vaidade é despertado e o professor sonha
o sonho ambíguo da inclusão social, da consciência política, da erradicação do
analfabetismo e vê a pátria amada como um país pensante que jamais se deixará
dominar. Audácia?
Todavia, continua tapeando as roupas com as mãos, na
tentativa de espanar o pó de giz. Sem quebrar o hábito, recolhe seus
instrumentos de trabalho que, ás vezes, não passa de um apagador. Arrepende-se
do verbo utilizado para falar de. Pune-se pela falta de qualidade no discurso.
A tentação intelectual, o conflito, o conformismo, a resignação, inteligência
para compreender a não-inteligência. Quantas falsas verdades! Há um vazio
sinistro em tudo. Que a sociedade entenda. Que seu coração entenda. Sempre essa
obrigação de comprometer-se com as ideias do outro. Até para pensar sua vida
particular, não consegue livrar-se do vício de uma terminologia adequada. É
possível que nunca se liberte dos métodos comuns à educação. É possível que
morra com a escola encravada nos pulmões. Mas o tempo vai respirar seus feitos
por eternidades. Amém.
Lucilene Machado
Lu, um texto visceral de quem respira o educar. Não para o mercado, mas para a vida.
ResponderExcluirParabéns!
Renato diz que essa assertiva é digna de sua capacidade intelectual e de sua sensibilidade aflorada de mulher.
ResponderExcluir..pinço do texto uma frase: "Sabedoria é um modo de ver as coisas". Creio que o professor "ideal" - pelo menos alguns que encontrei ao longo do tempo - é aquele que abre possibilidades de enxergar novos caminhos, e nunca o que mostra o caminho. Um grande mestre que tive, Cesar Nascimento, sempre fazia uso de um comnhecido jatgão seu quando não conseguia conduzir uma discussão a contento: "Senhoras e senhores, não somos uma sociedade de abelhas ou formigas! Ainda bem!" Enfim, professor é aquele que faz a diferença. Upa! Não resisti a esse ultimo jargão! Parabens, Lucilene, pelo belo texto e te peço autorização para reproduzí-lo no facebook! Posso? Abraços! (joel)
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